O clima e caráter "fascizante" que estamos a viver este ano a 
propósito dos "exames" no ensino básico (chamados de "provas finais") é 
completamente assustador, como sinal das mentalidades que nos governam. 
Trata-se de um clima que se vai refletindo-se depois em cadeia, através 
exercício de pequenos poderes, de quem vê assim o seu pequeníssimo poder
 reforçado e de um "autoritarismo" acéfalo, que tem "(cor)roído" o nosso
 quotidiano nas escolas. Houve docentes a serem convocados para serem 
corretores de provas com menos de 48h de antecedência, ou mesmo às 23h 
da noite; houve também aqueles que foram mantidos de "prevenção" nas 
escolas para além do seu horário habitual, sem qualquer convocação 
prévia de acordo com as normas legais em vigor, à espera de pautas, sem 
saber a que horas estas chegariam, dizendo-lhes que só poderiam ir-se 
embora justificando a sua falta com atestado médico, como se estivessem 
face a reuniões de avaliação, convocadas dentro da legalidade; aos 
professores vigilantes das provas foram dadas indicações expressas em 
como não podiam ausentar-se das salas onde estivessem a decorrer provas,
 nem em caso de má disposição, sem que alguém do secretariado de exames 
viesse dar autorização, o mesmo se aplica aos alunos, quer estes fossem 
do 4.º ano, quer do 6.º ou 9.º anos - uma regra igual para todos; os 
professores vigilantes também tiveram indicações muito precisas no 
sentido de os impedir de ler as provas durante a sua realização (só as 
poderiam ler quando estas fossem afixadas), tendo no entanto que 
verificar, minuciosamente, se os alunos usa(va)m a caneta preta (no caso
 dos alunos do 4.º ano) ou preta ou azul (nos restantes casos) ... [:-) 
... :-) ... não consigo escrever sobre isto sem me rir!!] ... ou o 
lápis, de acordo com o que for pedido na prova ... estão a perceber as 
incongruências e contradições?!? ...
A Norma 2/JNE, um
 documento com 128 páginas, com todas as indicações possíveis e 
imaginárias para a realização das provas, a sua classificação, etc. etc.
 ... Norma para a qual se remetiam todos os colegas quando se levantavam
 dúvidas ... não está se quer disponível online, nem no site da Direção 
Geral de Educação, do MEC, nem na página do IAVE, I.P., do mesmo 
ministério  (que, a bem dizer, ainda nem tem página web própria, apenas 
tem página do Facebook ... - conhecem aquela aplicação a que não se 
consegue ter acesso a partir das escolas na parte da manhã? ... ). Esta 
norma só está disponível online através de sites de escolas ... como 
será que estas acederam a tal  Norma? ...
O que nos 
querem exatamente mostrar? ... que pensam por nós, que mandam e que têm o
 nosso tempo, as nossas vidas, nas suas mãos?!?
Não 
está provado que exames nacionais contribuam para aumentar a qualidade 
da aprendizagem dos alunos, não conheço estudos sobre isso - existirão? 
Apenas se sabe que existe, numa certa opinião pública (revivalista e com
 saudades do "tempo da outra senhora"), reforçada pela superficialidade 
de certa comunicação social, uma crença de que sem exames tudo o que se 
passa nas escolas é de um enorme facilitismo e permissividade. Assim se 
justifica a necessidade imperiosa da figura da autoridade externa, o MEC
 (o lobo mau, o papão,  o chicote), para de "forma rigorosa" (de que 
tipo de rigor se fala?), vir mostrar o quanto é (in)útil o orçamento da 
educação, ou seja, o que os portugueses pagam pela escola pública.
Daquilo
 que me é dado observar, diretamente na escola onde trabalho, e naquelas
 por onde tenho andado (quer como professora, quer como orientadora de 
estágios, quer ainda como avaliadora externa - funções que me obrigam a 
desempenhar), o quotidiano das escolas é feito de um enorme 
profissionalismo pela maior parte dos professores, que fazem tudo o que 
está ao seu alcance para que os alunos aprendam (fazem sempre os 
possíveis, e frequentemente os impossíveis, também). Claro que ninguém é
 perfeito, e que nesta classe profissional, como em todas, há bons e 
maus profissionais - mas se a escola pública (grande parte do sistema de
 educação no nosso país) não fosse feita de bons e empenhados 
professores, há muito que o sistema já teria "falecido" (vale a pena 
comparar a percentagem do PIB gasta pelo nosso país na escola, com a de 
outros países da OCDE). 
Qual foi o orçamento envolvido nesta gigantesca operação das provas finais de ciclo? Quantos euros pesa ela no orçamento do MEC?
a elaboração e duplicação das Normas, bem como do funcionamento do JNE, ou será antes, do IAVE, I.P?
a
 deslocação dos alunos do 4.º para as escolas sede, para a realização 
das provas finais de ciclo pagas em muitos casos, pelas autarquias? ... e
 tudo o mais que envolveu a montagem desta gigantesca operação de 
logística: A montagem dos júris regionais de exames? a convocatória dos 
professores supervisores e dos professores corretores? os dois dias de 
aulas de que estes foram dispensados, perturbando o processo de 
aprendizagem dos alunos e a organização da vida nas escolas? a 
elaboração, duplicação, distribuição das provas, de forma sigilosa, com a
 intensa colaboração da GNR e da PSP? as deslocações, reuniões, 
telefonemas com os professores supervisores e corretores? 
Os
 resultados do trabalho quotidiano dos professores e dos alunos nas 
escolas, na maior parte dos casos acompanhado pelas famílias (da forma 
que melhor sabem e conseguem) não pode ser medido em hora e meia de uma 
prova final, elaborada a nível nacional pelo ministério. Bem sei que 
(felizmente!!) estas provas só valem 30% da nota final. Também todos 
sabemos que as dificuldades presentes na resolução das provas é 
facilmente manipulável pelo MEC - estamos muito longe da fiabilidade das
 provas realizadas pelo PISA (OCDE) ... Que os alunos vão bem a 
Português e mal em Matemática, comparando os resultados de apenas dois 
anos de exames nacionais, dois anos em que a dificuldades das provas foi
 manifesta diversa, parecem-me conclusões demasiado superficiais para os
 custos que imagino estarem envolvidos, custos estes que gostaria de ver
 explicitados.
Não é certamente com a implementação 
deste clima anacrónico e fascizante nas escolas, acompanhado das "provas
 finais de ciclo", aka, exames, que vamos deixar de ser o país da OCDE 
em que há a menor percentagem de adultos, entre os 25 e os 64 anos, com o
 ensino secundário concluído. De acordo com o especialista da OCDE, 
ouvido pelo PÚBLICO, só existem exames no 4.º ano na Turquia e na 
Bélgica (http://www.publico.pt/sociedade/noticia/analista-da-ocde-defende-que-exames-de-4%C2%BA-ano-tem-potencial-de-exclusao-social-1637322).
P.S.
 - Sou das que fiz exame da 4.ª classe, em 1968. Dois anos depois fiz o 
do 2.º ano do Ciclo Preparatório.  Em 1974, manifestei-me viva e 
convictamente contra os exames do antigo 5.º ano - por considerar que 
estes não iam contribuir em nada para o que tinha aprendido até aí. 
Penso hoje, o que já então pensava.
 
 
 
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