Só no final da semana passada soube do processo crime que tinha sido instaurado à Margarida Fonseca Santos, minha amiga e autora da peça «A Filha Rebelde» que foi levada à cena no Teatro Nacional D. Maria II (em 2007), e aos administradores à época do referido teatro, Carlos Fragateiro e José Manuel Castanheira.
Este processo crime foi interposto pelos sobrinhos de Silva Pais, o director-geral da PIDE/DGS, responsável máximo por todas as atrocidades (mortes, torturas, perseguições políticas, ...) perpetradas pelo regime ditatorial que deu origem ao 25 de Abril. Consideram eles que a peça tinha matéria ofensiva para a memória do seu tio - ao contrário do que acontece no livro com o mesmo nome, de José Pedro Castanheira e Valdemar Cruz, e no qual a autora da peça de teatro se baseou.
Inacreditável como é possível que a nossa justiça leve a julgamento um processo como este. Verdade seja dita que o Ministério Público não subscreveu a acusação.
Tem sido impressionante a adesão que tem tido no FaceBook o grupo de solidariedade com estes réus - http://www.facebook.com/home.php?sk=group_218651868154749¬if_t=group_r2j - uma verdadeira progressão geométrica de adesões: cemeçámos por ser 40 no primeiro dia, depois 200 (segundo dia), depois 400 (terceiro), 600 (quarto dia) e, ontem à noite, no final do quinto dia, éramos já mais de 900 membros. Lá temos procurado reunir toda a informação que nos tem chegado sobre este "inacreditável" processo.
Está em causa a liberdade de expressão, a censura à actividade e liberdade artísticas, a memória de tantos que sofreram e morreram pelas mãos da PIDE/DGS. Há já quem fale em levar o processo para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, em Estrasburgo, caso não seja feita cá justiça. Não quero nem pensar que tal não venha a acontecer.
As memórias e as revoltas que têm vindo à superfície são testemunhos históricos, na primeira pessoa, impressionantes.
Sabemos como há movimentos, mesmo a nível internacional, para que a história seja reescrita, naquilo que ela tem de mais obscuro: ontem, ouvi na audiência do julgamento, que o Silva Pais tinha sido absolvido no julgamento dos assassinos do Humberto Delgado - isto dito por uma testemunha de acusação (ela nem sabia que ele não tinha sequer sido julgado por ter morrido a meio do processo; mas sabia que ele tinha uma péssima fama junto do povo português! ... vá-se lá saber porquê!?!?! ... :-)); sabe-se também que há quem queira negar a existência das atrocidades que foram cometidas em Auschwitz; ... e haverá certamente mais casos.
Frequentemente em casos como este "o feitiço vira-se contra o feiticeiro", como diz o ditado popular e, na minha modesta opinião, é isso que está já a acontecer com toda esta solidariedade e o avivar da nossa memória colectiva que tem gerado.
As repercussões deste processo e de toda a mobilização que tem gerado são para já imprevisíveis. Confio que seja feita justiça, para já no tribunal, relativamente a este inconcebível processo crime, e em muitas outras dimensões da nossa vida e actividades colectivas: reedição do livro, levar a peça novamente à cena, o surgimento de novas publicações, ... e tudo o mais que a nossa grande criatividade nos ditar!! ...
Todos temos que fazer a nossa parte - e muito será feito se cada um fizer a sua!! ... esta é a minha, o meu modesto contributo para avivar memórias, para me solidarizar com uma LINDA amiga e os outros réus deste processo, bem como com todos os que sofreram de forma directa, ou mesmo indirecta, com as atrocidades da PIDE/DGS, ao lutarem pela democracia e por uma sociedade mais justa para este país.
2 comentários:
Já conhecia a história.
E depois dizem que a justiça vai mal em Portugal... pois vai sim... e muito mal!!
... já somos 1000 membros no grupo do FaceBook, numa semana - gerou-se uma onda de solidariedade, "memórias" e de revoltas que estavam contidas, que nem imaginas!!
Bjs e bom fds
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