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Os palhaços e os filhos da p...
Ramada Curto foi um advogado e jornalista bastante popular do
meio teatral e jornalístico lisboeta da primeira metade do século XX,
tendo intervindo nalguns dos processos-crime mais célebres do seu
tempo.
Uma das suas histórias judiciais que ficaram célebres teve a ver com a defesa de um arguido acusado de chamar “filho da p…”
ao ofendido, expressão que, na altura, era considerada altamente
ofensiva. Nas suas alegações, Ramada Curto começou por chamar a atenção
do juiz para o facto de, muitas vezes, se utilizar essa expressão em
termos elogiosos (“Ganda filho da p…, é o melhor de todos”) ou carinhosos (“Dá cá um abraço, meu grande filho da p…!”), tendo concluído as suas alegações da seguinte forma: “E
até aposto que, neste momento, V. Ex.ª está a pensar o seguinte: “Olhem
lá do que este filho da p… não se havia de ter lembrado só para safar o
seu cliente!...”.
Chegada a hora de sentença, o juiz vira-se para o réu e diz: “O senhor vai absolvido, mas bem pode agradecer ao filho da p… do seu advogado”...(!!!)
Isto vem a propósito de recente afirmação de Miguel Sousa
Tavares, que fez a capa do Jornal de Negócios, de que nós já teríamos
um palhaço que se chamava Cavaco Silva. O que tu foste dizer?!... Em
Portugal, os nossos políticos são todos muito susceptíveis e o povo
muito reverente. Em Portugal, um político pode arruinar uma
autarquia ou um país, enriquecer os amigos e a família e lançar o povo
na miséria, destruir lares, famílias e vidas, que não lhe acontece nada. Mas, se alguém chama “palhaço” a um político, tem logo o procurador e a polícia à perna.
Eu até compreendo que certos políticos não gostem que lhes chamem “palhaços”, porque, efectivamente, os únicos e verdadeiros palhaços nesta história não são os eleitos mas quem os elegeu. Com efeito, por muito que nos custe reconhecer, os palhaços somos nós,
o povo eleitor, que, durante os últimos vinte anos, temos eleito e
sido governados pelos ofendidos da história de Ramada Curto.
Santana-Maia Leonardo,
Ponte de Sor
(Jornal Público, Cartas ao Director, 28-05-2013)
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